Ana Filipa, de seis anos, está viva por uma sucessão de acasos. Os médicos não hesitam em usar a palavra "milagre". Na manhã de 15 de Julho, quando brincava na escola, em Évora, teve um colapso e perdeu os sentidos. Os monitores que a socorreram julgaram que tinha sofrido um ataque epiléptico.Ninguém podia imaginar que o desmaio havia sido causado por uma ruptura da artéria aorta. É que em Portugal nunca houve casos semelhantes em crianças tão novas. São tão raros que, na literatura médica, só há registo de dois em todo o mundo, operados com sucesso (ver caixa abaixo).É mais habitual em pessoas idosas, com problemas de hipertensão, como Albert Einstein, que morreu aos 76 anos. Quase 90% dos pacientes não chegam sequer ao hospital. Ana Filipa aguentou-se durante várias horas até ser operada. O rápido diagnóstico feito no Hospital de Évora pela equipa de pediatras e cardiologistas foi o primeiro passo para o salvamento da rapariga alentejana. "Contei aos médicos que ela tinha sido sujeita a um cateterismo cardíaco com um ano de idade. Tem a artéria aorta dilatada desde que nasceu", conta a mãe, Ângela Janeiro, que esteve ao lado da filha desde as 10h30 da manhã, altura em que lhe telefonaram da escola. "Se eles não tivessem acertado logo, ela não teria sobrevivido." A empregada de balcão lembra que os médicos contactaram de imediato o Hospital de Santa Cruz, em Carnaxide. "Por sorte, o bloco operatório, normalmente sem vagas, naquela tarde estava disponível. E era fácil reunir a equipa de cirurgiões", diz uma fonte do hospital. Todos sabiam que era uma corrida contra o tempo e que qualquer erro poderia ser fatal. "Ainda se pensou na hipótese de a transportar de helicóptero mas alguém lembrou que a trepidação da aeronave podia ser prejudicial para a criança", recorda Ângela Janeiro. O hospital, os bombeiros e a GNR de Évora coordenaram-se para levar Ana Filipa de ambulância até aos arredores de Lisboa. Rodeada de uma escolta policial para não haver carros a atrapalhar. No tempo recorde de 45 minutos, a menina alentejana saiu de Évora e chegou aos cuidados intensivos do hospital de Carnaxide. E pronta para ser operada. Eram 16h30, ainda assim seis horas após a ruptura na principal artéria do coração. "Estávamos muito cépticos. Achávamos que ela não chegaria cá com vida", confessa um cardiologista de Carnaxide. A cirurgia, liderada por Miguel Abecassis, embora complexa, por ser rara em pacientes desta idade e envolver a manipulação dos tecidos numa zona muito delicada, foi um sucesso. "Ela é uma sobrevivente. É um caso que não se volta a repetir", diz o mesmo especialista.Ana Filipa teve sorte porque a aorta se rompeu na parte de trás, onde se situa a artéria pulmonar que fez de tampão, contendo a hemorragia: "Se a aorta se tivesse rompido à frente o sangue acumulava-se em redor do coração e ela morria subitamente". Se tivesse sofrido este colapso durante a noite, talvez não voltasse a acordar.
Feliz Natal Clara, Inês e Laura
Há 14 anos
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